Quando comecei a me especializar em design de interação, uma das coisas que mais me chamou atenção foi a capacidade holística das matérias estudadas de fomentar a diversidade dentro dos projetos como forma de gerar soluções cada vez mais assertivas e de qualidade. Pela primeira vez, entendi na prática como que aplicar a pluralidade corporativa pode, de fato, trazer resultados além do social e garantir sucesso financeiro e acadêmico, agradando a clientes e usuários. Foi por perceber as riquezas que incluir diversidade em qualquer projeto traz para o resultado galgado que hoje me considero designer advogado da diversidade dentro do SiDi. E as recompensas já estão aparecendo.
Gerando inovação para um Brasil diverso.
Antes de mais nada, precisamos entrar no debate quase clichê sobre a diversidade brasileira. Apesar de ser um assunto que se repete constantemente, matérias jornalísticas e artigos científicos, ele ainda se faz necessário. Seja pela sua pluralidade de raça, cor, religião, sexualidade ou gêneros, o Brasil tem a diferença cravada na sua identidade. E se, como designers, o nosso papel é gerar soluções inovadoras para esse público, precisamos entender como ele funciona na sua totalidade. E se as premissas do design pregam a empatia como fundamento metodológico, ela também precisa estar instituída na equipe que desenvolverá a solução. Mas a empatia tem limite e a vivência individual é seu Calcanhar de Aquiles.
É comum aparecerem situações de soluções inovadoras do ponto de vista tecnológico que ainda perpetuam comportamentos que excluem certos grupos sociais. Casos clássicos, como sistemas de câmera que não reconhecem pele negra, assentos de avião que não comportam pessoas obesas, plataformas de vídeo sem audiodescrição ou legenda, aparecem como manchetes quase que mensalmente. Esses exemplos poderiam ser facilmente contornados com o exercício de diversidade corporativo. Esses casos extremos são exemplos extremos, mas a falta de diversidade afeta diretamente uma alta parcela da população que pode deixar de consumir determinados artefatos que não a comporta.
Um exemplo interessante de público ávido por tecnologia que é constantemente descartado como foco de inovação é a comunidade LGBTQIA+. Só no Brasil, essa parcela da população movimenta cerca de R$ 418 bilhões por ano (O Globo), tendo um dos seus maiores interesses de satisfação de compra a busca por novas tecnologias (Sebrae, 2015). Mesmo assim, o interesse nesse capital é baixíssimo, sendo até objeto de estudo em que se conclui que há poucas pesquisas sobre o comportamento de potenciais diferenças de consumo entre o público LGBTQIA+ e a parcela heteronormativa da sociedade (Newman e Nelson). Quando o assunto é raça, a situação também é preocupante. De acordo com pesquisa realizada pelo Instituto Ethos com as 500 maiores empresas do Brasil, apenas 6,3% de cargos na gerência e 4,7% no quadro executivo são ocupados por homens negros. A presença de mulheres negras é ainda menor: dentre as empresas, elas preenchem apenas 1,6% das posições na gerência e 0,4% no quadro executivo.
Design Universal
Do ponto de vista metodológico, temos algumas vertentes que estão se disseminando cada vez mais como norte de grandes equipes de design do mundo inteiro. Dentre as mais fortes atualmente está o conceito de Design Universal. De acordo com Erlandson, podemos conceituar essa vertente como “o estudo de desenvolvimento de ‘entidades’ que podem ser usadas por pessoas de quaisquer habilidades, em toda sua extensão possível, sem adaptabilidade.” Ou seja, trazer todos os indivíduos para dentro da possiblidade de uso da sua plataforma sem que ela precise ser remoldada caso a caso.
Para universalizar a aplicação dessa matéria em projetos de todo o mundo, o The Center for Universal Design lançou, em 1997, os 7 princípios que caracterizam o design universal. São eles:
- Uso equitativo — O design deve ser usável e comercializado para pessoas de habilidades diversas.
- Flexibilidade de uso — O design deve acomodar uma variedade considerável de preferências e habilidades individuais.
- Uso simples e intuitivo — O uso do design é simples de entender, independentemente da experiência do usuário, conhecimento, habilidade linguística ou atual nível de concentração.
- Informações perceptíveis — O design comunica informações necessariamente efetivas ao usuário, independentemente das condições do ambiente ou das habilidades sensoriais do usuário.
- Tolerância ao erro — O design deve minimizar os riscos e reações adversas no caso de ações acidentais ou involuntárias.
- Baixo esforço físico — O design pode ser usado com eficiência e conforto com o mínimo de fadiga.
- Tamanho e espaço para aproximação e uso — Tamanho e espaço apropriados são fornecidos para abordagem, alcance, manipulação e uso independentemente do tamanho do corpo do usuário, postura ou mobilidade.
O aprofundamento dessas vertentes e aplicação em soluções, sejam elas quais forem, podem ser a diferença entre o sucesso e o fracasso de uma nova aplicação em um mundo tão diverso, concorrido e globalizado quanto o nosso.
Promovendo diversidade
Antes de mais nada, é preciso deixar claro que diversidade é igual a lucro. Começando pelas contratações. Investir em diversidade é garantir não só justiça social, mas também que uma empresa chegará mais facilmente às soluções verdadeiramente inovadoras. É com diversidade corporativa que se alcançam os mais diversos públicos e clientes. E é por esse âmbito que precisamos enxergar o mercado. Inclusão é fazer com que o outro, antes invisibilizado, exista. Portanto, se ele existe, é um cliente em potencial que prefere consumir aquilo que lhe é necessário ou semelhante.
Com esse ponto de partida, encontramos agora a difícil tarefa de fomentar a diversidade dentro desses ambientes. Afinal, é preciso que essas pessoas sintam-se à vontade para exercer quaisquer que sejam suas atribuições. Aqui no SiDi, nós encontramos algumas formas de aplicá-la de forma exponencial e bem sucedida. Primeiro, temos semestralmente um evento chamado Semana do Design, onde fomentamos a importância e bons resultados que uma boa equipe de design oferece para a empresa. Dentro desse evento, sempre nos preocupamos sempre de mostrar os benefícios que uma equipe diversa pode trazer para os nossos projetos. Segundo, também dentro do SiDi, foi criado um grupo chamado Sidadania (do qual faço parte). Dentro desse grupo, existe um subgrupo chamado Diversidade que tem como objetivo debater e aplicar mudanças de comportamento e de cultura corporativa, com foco na diversidade. Esses dois exemplos foram imprescindíveis para uma transformação extremamente positiva na empresa. Afinal, tudo vem com o objetivo além do educacional. Aqui, queremos ver ações e elas estão vindo. Uma das mais relevantes é a implementação da busca por vagas exclusivas para PCDs (pessoas com deficiência).
No final, fica perceptível e palpável o aumento da qualidade das entregas, das dinâmicas sócioprofissionais e da capacidade inovadora de qualquer equipe. Investir em diversidade é garantir resultados únicos, com foco em alcançar lugares que outras empresas ainda nem sonham em chegar. Entender o poder capital que as diferenças podem trazer para uma corporação é, sem sombras de dúvida, estar na frente de um mercado tão competitivo e em constante evolução.
Fontes:
The Center For Universal Design — Universal Design Principles
Universal and Accessible Design for Products, Services, and Processes — Robert F. Erlandson
Introdução ao Design Inclusivo — Daniela Gomes & Manuela Quaresma
O Globo — Potencial de compra LGBTQ estimado em R$ 419 bilhões.
SEBRAE — Oportunidade de negócio: consumidor gay gasta 3x mais que hetero e adora moda
Newman, P. J. & Nelson, M. R. — Mainstream legitimization of homosexual men through valentine’s day gift-giving and consumption ritual.
Instituto Ethos (Plataforma TODXS) — Por que diversidade e inclusão são temas prioritários no mundo corporativo?